segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Transformações Urbanas

Numa cidade, os parques são tão essenciais para a saúde física e emocional como o abastecimento de água”. Ele diz que este facto não transparece dos orçamentos das câmaras municipais, onde os parques são considerados um luxo. Pelo contrário, “as estradas, o espaço público dos carros, recebem recursos infinitamente maiores e estão sujeitas a menos cortes orçamentais que os parques, o espaço público para as crianças. Porquê?” pergunta ele, “serão os espaços públicos dos carros mais importantes que os espaços públicos para as crianças?”
«Este artigo, simpático e de fácil leitura, atraiu a minha atenção por servir de alerta para quem tem, em países em desenvolvimento, a responsabilidade de gizar as cidades em que as gerações futuras vão viver e prosperar. Ele pode ajudar a prever situações futuras que não queremos que aconteçam nas nossas ilhas mas que começam a despontar e que estão mesmo bem patentes no desinteresse que as administrações demonstram para com as crianças da nossa terra, que são enfim, como dizia Cabral “ As flores da revolução”.»

As cidades do planeta estão com grandes problemas. A Cidade do México, Teerão, Banguecoque, Shanghai e em centenas de outras cidades, a qualidade da vida diária está a deteriorar-se. Respirar o ar de algumas cidades é equivalente a fumar dois maços de cigarros por dia. Nos EUA, o número de horas que os automobilistas passam nos engarrafamentos de transito aumenta a cada ano que passa.
Como resposta a estas situações os cientistas buscam um novo urbanismo. Uma das transformações urbanas modernas dignas de registo ocorreu em Bogotá, Colômbia, onde Enrique Peñalosa serviu como Presidente da Câmara durante três anos, a partir de 1998. Quando ele tomou posse não perguntou como se poderia melhorar as condições e qualidade de vida dos 30 por cento que possuem um automóvel; ele quis saber o que podia ser feito para melhorar os padrões de vida dos 70 por cento - a maioria - que não tinham carro.
Peñalosa apercebeu-se de que uma cidade que for agradável para crianças e idosos também funciona bem com o resto dos cidadãos.
Em questão de poucos anos, ele transformou a qualidade da vida urbana com a sua visão de uma cidade feita para as pessoas. Sob a sua liderança a cidade eliminou comportamentos como estacionar em cima dos passeios, criou e renovou 1200 parques de estacionamento, introduziu um sistema de transportes públicos rápidos e eficientes, mandou construir centenas de quilómetros de pistas para bicicleta e ruas só para peões, reduziu os engarrafamentos da hora de ponta em 40 porcento, plantou 100000 árvores e envolveu os cidadãos locais nos melhoramentos dos seus próprios bairros. Com isto ele criou um sentimento de orgulho cívico entre os 8 milhões de residentes, tornando as ruas de Bogotá mais seguras que as de Washington, D.C.
Enrique Peñalosa comenta que “os espaços públicos para peões em geral e os parques em particular são uma evidência da democracia em funcionamento”. Ele também afirma: “Os parques e espaços públicos são também importantes para uma sociedade democrática porque eles são os únicos locais onde as pessoas se encontram como iguais… Numa cidade, os parques são tão essenciais para a saúde física e emocional como o abastecimento de água”. Ele diz que este facto não transparece dos orçamentos das câmaras municipais, onde os parques são considerados um luxo. Pelo contrário, “as estradas, o espaço público dos carros, recebem recursos infinitamente maiores e estão sujeitas a menos cortes orçamentais que os parques, o espaço público para as crianças. Porquê?” pergunta ele, “serão os espaços públicos dos carros mais importantes que os espaços públicos para as crianças?”
Hoje em dia, os estrategas urbanistas estão a investigar, buscando vias para projectar cidades para pessoas e não carros. Os carros prometem mobilidade e conseguem oferece-la em ordenamentos do tipo rural. Mas na realidade urbana existe um conflito latente entre o automóvel e a cidade. A partir de um certo ponto, em que os números se multiplicam, os automóveis oferecem imobilidade e não mobilidade
Os engarrafamentos representam uma factura directa em termos de tempo e gasolina. A poluição urbana do ar, provocada pelos automóveis, é hoje responsável por inúmeros casos de doenças respiratórias, muitas delas fatais.
Um outro esforço das cidades dedicadas aos carros é um esforço psicológico, a privação do contacto com a natureza –o chamado “complexo do asfalto.” É reconhecido que o ser humano tem absoluta necessidade de contactar com o mundo natural. Quer os psicólogos quer os biólogos fazem questão de nos alertar para esse facto. Os ecologistas têm vindo a formular a teoria da “hipótese da biofilia “ que defende que aqueles que estão impossibilitados de contactar com a natureza sofrem psicologicamente e que essa inibição leva a um declínio assinalável do seu bem-estar.
Ao longo da era moderna, na grande maioria dos países, a procura de financiamento para os transportes foi altamente distorcida, sendo destinada à construção e manutenção de estradas. A criação de cidades com maior qualidade de vida e a mobilidade que as pessoas precisam depende de financiamento dirigido ao transporte público por autocarros e a parques e pistas de bicicletas.
As boas notícias são que há sinais de mudança e claras indicações de que se quer cada vez mais desenhar as cidades para as pessoas e não para os carros. O aumento do preço da gasolina está a levar automobilistas por esse mundo fora a trocar o carro pelo autocarro, metro ou bicicleta.
Quando Pequim decidiu promover um sistema de transportes baseado nos carros, um grupo de cientistas chineses protestaram argumentando que a China não tem espaço de terra arável suficiente para acomodar todos os automóveis e alimentar a população. Isto também é verdade para a Índia e outros países em desenvolvimento.
Algumas cidades estão muito mais avançadas em planeamento e em acomodar o seu crescimento do que outras. Elas apresentam planos para sistemas de transporte que garantem mobilidade, ar puro e exercício físico, em total contraste com cidades que oferecem engarrafamentos, ar poluído e poucas oportunidades de exercício.
Bons exemplos são cidades como Amesterdão, Copenhaga e Paris.
Paradoxalmente, as cidades dependentes do automóvel têm mais congestionamento e menos mobilidade do que as cidades que oferecem mais alternativas de transporte.
O veículo automóvel, inventado para oferecer mobilidade, acaba por ser, nessas cidades o factor virtual de imobilização de toda a população, tornando a vida difícil a ricos e pobres.
As estratégias de transporte de longo prazo para os países em desenvolvimento assumem que um dia todos terão um carro. Esta visão, infelizmente é insustentável, dados os constrangimentos de espaço e também de reservas de combustíveis. Estes países estarão a oferecer uma maior mobilidade se planificarem com base nos transportes públicos e na bicicleta.
José Pedro Duarte Fonseca - Professor Universitário, Técnico Superior do MECC

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